Em estado de conferência nacional de cultura

Por Fabiano Piúba*

Tenho dito que estamos em estado de conferência nacional de cultura. Um estado de espírito, um estado de ânima e um estado político de encontro e movimento.

Num contexto de isolamento social, nem nós esperávamos por isso. Emergiu de uma mobilização emergencial em torno de um projeto de lei de iniciativa das formidáveis Benedita da Silva e Jandira Feghali e foi ganhando corpo sensível e político com força e ternura, reacendendo um tanto de encantamento pela cultura e um caldo de resistência por meio da arte. A arte é o que resiste, já pensou Deleuze. Assim, assado, estamos também em estado de resistência. A cultura está viva. A Lei de Emergência Cultural Aldir Blanc é fruto de uma construção social e autoria coletiva.

Gosto de pensar a cultura como saber/fazer comum, portanto, a cultura como solidariedade e elemento (água, terra, fogo e ar) de transformação de vidas e transgressão de realidades.

O que estou querendo dizer é que este estado de conferência nacional de cultura é um ato político solidário para com o Brasil. Cabe a nós manter essa chama acessa como uma chamada que vai além do emergencial, pois a execução desta lei é estratégica para as políticas culturais. Ela exige de nós um plano de gestão nos estados e municípios numa ação integrada com os conselhos estaduais e municipais de cultura, com os fóruns de linguagens artísticas e dos segmentos culturais, com as redes do Cultura Viva e Pontos de Cultura e com os coletivos espalhados pelo país.

Estamos diante de uma oportunidade real de desenvolver o Sistema Nacional de Cultura e a ideia de um MinC Popular parece ser potente. Com a sua extinção, o MinC somos nós. Não podemos fazer feio e tampouco falhar. Temos que ser exemplares na execução, nos resultados e impactos da aplicação da lei nos estados e municípios como uma ação primordial dos artistas, agentes e espaços culturais existentes e resistentes no Brasil.

A cultura – como traduziu tão lindamente Alexandre Santini ao celebrar a Lei Aldir Blanc – é a esperança equilibrista. E equilíbrio é a força que age entre duas ou mais coisas ou pessoas. A cultura é no mínimo dois, nos lembrou Gilberto Gil. E assim de novo estamos conjugando no plural. Com força e ternura, como recorda Célio Turino. Pois bem, as tecelãs estão na teia, o baião tá pisando o barro do chão, o samba tá trovejando, o toré tá chamando a força, a capoeira tá na roda e a ciranda tá girando. E pra dançar ciranda – na voz de trovão de Lia de Itamaracá – juntamos mão com mão.

Noutras palavras, ninguém solta a mão de ninguém. A democracia está sob ataque e a cultura tem um papel central para seu exercício pleno e para soberania nacional. Não podemos nos distrair nem desmobilizar nosso estado de espírito político de conferência nacional de cultura. Tolo de quem pensa que só estamos lutando por uma lei emergencial. Em nós ecoa os Doces Bárbaros: com amor nos corações preparamos a invasão (da cultura) cheio de felicidades, entrando em nossas cidades amadas, pois nossos planos são muitos bons!

*Fabiano dos Santos Piúba é o secretário de cultura do estado do Ceará

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